A Lei da Reciprocidade Ambiental-Comercial: Oportunidades para o Brasil em um cenário global em transformação
- Gláucia Brasil

- 14 de abr.
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1. Introdução
Nos últimos anos, o comércio internacional passou a incorporar com mais intensidade critérios ambientais como condicionantes para o acesso a mercados estratégicos. A tendência, embora compreensível sob a ótica da sustentabilidade, tem provocado preocupações legítimas entre países exportadores, como o Brasil, especialmente quando tais critérios se tornam instrumentos de limitação comercial. A recente decisão dos Estados Unidos de elevar tarifas sobre bens estratégicos, em consonância com medidas semelhantes adotadas pela União Europeia, reforça esse movimento.
Diante desse cenário, o Projeto de Lei nº 2.088/2023, originalmente apresentado como reação às exigências ambientais europeias, ressurge como um mecanismo oportuno e legítimo de defesa da competitividade brasileira. Mais do que uma simples resposta reativa, a proposta — especialmente após as emendas que redirecionam sua aplicação para a esfera da política comercial — revela-se um instrumento estratégico que pode fortalecer a posição do Brasil nas negociações internacionais, preservando, ao mesmo tempo, sua vocação sustentável.
2. O PL 2.088/2023 e sua evolução
Apresentado pelo Senador Zequinha Marinho, o Projeto de Lei nº 2.088/2023 buscava, em sua redação original, assegurar o tratamento recíproco nas relações comerciais com países que impõem barreiras ambientais ao Brasil. A ideia central era condicionar a entrada de produtos estrangeiros no mercado brasileiro à adoção, pelo país de origem, de padrões ambientais compatíveis com os exigidos internamente.
A proposição nasceu como resposta à chamada “lei antidesmatamento” da União Europeia, que estabelece exigências rigorosas para a comprovação da origem de produtos importados, sobretudo do agronegócio. No entanto, ao longo da tramitação, o projeto passou por importantes adaptações, culminando no substitutivo apresentado pela Senadora Tereza Cristina, relatora da matéria na Comissão de Meio Ambiente.
O substitutivo desloca o foco da iniciativa para a esfera da política comercial, conferindo à Câmara de Comércio Exterior (Camex), em articulação com os Ministérios das Relações Exteriores e do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, a competência para adotar contramedidas proporcionais a barreiras impostas por países ou blocos econômicos que afetem a competitividade de produtos brasileiros.
3. O contexto recente e as novas oportunidades
Ainda que o projeto tenha sido protocolado antes da eleição de Donald Trump em 2024, sua relevância foi amplificada diante da nova realidade geopolítica. O governo norte-americano, exercendo plenamente sua soberania e de acordo com suas convicções internas, tem adotado medidas voltadas à proteção de setores estratégicos de sua economia, inclusive por meio de tarifas e exigências regulatórias com base em critérios ambientais. A União Europeia, por sua vez, vem reiterando exigências ambientais que, embora legítimas em seu conteúdo, acabam impondo custos adicionais relevantes aos exportadores brasileiros.
Esse ambiente internacional, embora desafiador, cria uma janela de oportunidade para que o Brasil se posicione de forma mais estratégica e proativa nas negociações multilaterais. O substitutivo ao PL 2.088/2023 não apenas reconhece essa oportunidade, como também fornece uma resposta institucional madura e tecnicamente embasada.
Ao articular a possibilidade de retaliações comerciais dentro de parâmetros proporcionais e sob coordenação diplomática, o projeto evita o confronto direto e promove o diálogo qualificado. Mais ainda: oferece ao Brasil uma chance de valorizar seus próprios diferenciais ambientais — como a matriz energética predominantemente renovável, a legislação florestal robusta e os compromissos assumidos no Acordo de Paris.
4. Caminhos institucionais e diplomáticos viáveis
O novo texto confere protagonismo à Camex, ao MRE e ao MDIC, estabelecendo mecanismos regulatórios transparentes, com espaço para consultas públicas e monitoramento periódico. Isso garante previsibilidade, segurança jurídica e consistência institucional às eventuais contramedidas adotadas pelo Brasil.
Ao contrário de uma política de confronto, o que se propõe é a construção de um instrumento legítimo de negociação, que sirva tanto como escudo quanto como alavanca nas mesas multilaterais. A adoção de critérios objetivos, a exigência de proporcionalidade e o compromisso com a redução de impactos internos reforçam o caráter responsável da iniciativa.
Mais do que uma reação, trata-se de uma ação coordenada que fortalece a posição do Brasil como parceiro confiável, que respeita as regras internacionais, mas também exige o mesmo tratamento em nome da isonomia e da justiça no comércio global.
5. Conclusão
O substitutivo ao Projeto de Lei nº 2.088/2023 representa uma resposta equilibrada e estratégica aos desafios impostos por um cenário internacional cada vez mais regulado por normas ambientais unilaterais. Sem romper com os compromissos multilaterais assumidos pelo Brasil, a proposta fortalece os mecanismos internos de defesa comercial e amplia a capacidade do país de negociar em igualdade de condições com seus principais parceiros.
Mais do que um instrumento de retaliação, a nova redação oferece uma oportunidade: a de reposicionar o Brasil como uma liderança global que alia sustentabilidade, soberania e inteligência comercial. Em um mundo em transição, saber reagir com serenidade e visão estratégica pode ser o maior diferencial de um país que já tem muito a oferecer.
Breves ensaios jurídicos sobre esse tema.
Gláucia Brasil • advogada Agro Empresarial



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